Sep
22
Sistema financeiro e sustentabilidade
Pela primeira vez na história, as nações chegaram a um consenso quanto ao caminho a percorrer para a sustentabilidade.
As Metas de Desenvolvimento Sustentável (SDG, na sigla em inglês), a serem adotadas nesta semana em Nova York, estabelecem para todos os países desenvolvidos e em desenvolvimento o imperativo de enfrentar os problemas econômicos, sociais e ambientais mais prementes. Ainda neste ano, o mundo terá uma chance de consolidar essas metas com um acordo sobre o clima, em Paris.
Nossas sociedades e nosso meio ambiente estão demasiadamente interligados para que qualquer solução isolada seja sustentável. É necessário que ela seja integrada.
Sendo um dos elos de integração social, o setor financeiro é fundamental para a sustentabilidade, mas hoje opera como um motor de combustível inadequado, ameaçado de travar quando forçado. Está longe de seu pleno potencial, que precisa ser explorado para estar à altura do acordo de Paris.
A boa notícia é que já são visíveis os sinais de transição. Na última década, aumentaram os esforços para combinar fatores ambientais e sociais nas decisões financeiras. O mercado de títulos verdes (green bonds), em que recursos são investidos em eficiência energética, energia renovável e transporte sustentável, cresceu de US$ 11 bilhões em 2013 para mais de US$ 66 bilhões só no primeiro semestre de 2015.
Os investidores institucionais, que administram mais de US$ 62 bilhões em ativos, comprometeram-se a reduzir a intensidade de carbono nas carteiras de seus fundos. Mas ainda há barreiras significativas a novos avanços.
De acordo com dados do FMI (Fundo Monetário Internacional), o setor da energia é subsidiado em cerca de US$ 5,3 trilhões anualmente por incentivos diretos oficiais e, indiretamente, ao não se internalizarem custos ambientais, como a poluição. Os preços na economia real têm que mudar para contabilizar essas externalidades.
Paralelamente, é preciso uma ação no âmbito das finanças. Isso motivou a pesquisa "Projeto para um Sistema Financeiro Sustentável" do Pnuma (o programa ambiental da Organização das Nações Unidas), um balanço das medidas tomadas até agora e de quais ainda são necessárias.
Sua principal conclusão é encorajadora: há uma "revolução silenciosa" para integrar a sustentabilidade ao sistema financeiro, liderada, surpreendentemente, pelos países emergentes.
O Brasil é um desses líderes, com um ecossistema único de finanças. Em 2005, a Bovespa introduziu o Índice de Sustentabilidade Empresarial. Em 2014, o Banco Central criou requisitos para que os bancos adotassem política de responsabilidade social e ambiental e diretrizes sobre as ações estratégicas para sua governança.
Em uma ação paralela, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) criou um sistema de autorregulação para seus membros e começou a medir a proporção de capital direcionado a financiamentos verdes nos bancos associados.
Em outros países, como Indonésia, China e França, há passos nessa mesma direção. É importante reforçar essa dinâmica. As próximas etapas dependem também de consumidores, trabalhadores e membros da sociedade civil. Alterar comportamentos individuais é a solução mais sustentável de todas.
A definição das metas coletivas para um futuro verde revela o potencial das sociedades para trabalhar coletivamente em prol de toda a humanidade. Compreendê-las permitirá aproveitar o potencial dos sistemas que as sustentam, como o financeiro, um dos que se preparam para ir em frente - não mais brecando, mas mudando de marcha.
Por MURILO PORTUGAL, presidente da Febraban - Federação Brasileira de Bancos; foi secretário-executivo do Ministério da Fazenda (governo Lula) e diretor-geral-adjunto do Fundo Monetário Internacional (2006-2011), e ACHIM STEINER, diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e subsecretário-geral da ONU
Fonte: Folha de S. Paulo, Tendências & Debates, 21/09/2015
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