A Casa D`Agua - O urbanismo social do arquiteto Alejandro Echeverri

Sep

25

O urbanismo social do arquiteto Alejandro Echeverri

Fonte: O Globo 
 

No momento em que o carioca convive com várias frentes de obras de infraestrutura, o Rio recebe um nome da arquitetura internacional que se tornou sinônimo de transformação urbana e social. Mais precisamente, o urbanismo social é o principal conceito por trás do trabalho do colombiano Alejandro Echeverri, que provocou mudanças radicais na cidade de Medellín ao conceber um plano de desenvolvimento dando prioridade às áreas mais pobres. Sua experiência como secretário de Desenvolvimento Urbano de Medellín, num paralelo com a revitalização da Zona Norte carioca, foi tema de uma conversa nesta segunda-feira no evento de arquitetura e urbanismo Arq.Futuro, que acontece no Teatro Adolpho Bloch, na Glória. Já nesta terça-feira, ele participa da mesa "Inovação nos espaços públicos e em mobilidade", marcada para as 10h15.
 
No trabalho em Medellín, novas escolas e bibliotecas públicas, parques e centros comunitários foram construídos com belos projetos arquitetônicos, redefinindo a paisagem.
 
Duas das novas construções têm a assinatura de Echeverri: o Parque Explora Museu de Ciência e Tecnologia e o Centro de Inovação e Negócios, parceria com Emerson Marín. O programa urbanístico, que também conectou essas áreas mais críticas da cidade ao sistema de transportes, com intervenções como teleféricos, foi acompanhado por ações educacionais da prefeitura de Sergio Fajardo. O resultado? Uma drástica redução da violência e a revalorização de áreas antes esquecidas, contaminando toda a cidade. Hoje diretor do Urbam - Centro de Estudos Urbanos e Ambientais da Universidade EAFIT, o premiado Echeverri colocou o programa em prática entre 2004 e 2008, mas ainda acompanha seus desdobramentos, como relata na entrevista concedida ao GLOBO.
 
O senhor já afirmou que concentrar os investimentos em áreas pobres depende essencialmente de uma decisão política.O senhor acredita que esse direcionamento seria interessante no contexto da preparação do Rio para os grandes eventos esportivos de 2014 e 2016?
 
Na nossa experiência em Medellín, a implementação de políticas públicas e programas de desenvolvimento nas áreas menos favorecidas criou um resultado muito positivo para a cidade como um todo. Medellín passou a atrair turistas e o interesse internacional. Os efeitos chegam a outras áreas num processo de renovação econômica e inovação. A questão principal na preparação das cidades para esses grandes eventos esportivos é fazer uma ligação entre as intervenções e os processos reais do lugar, as pessoas e a economia.
 
Considerando um programa como o de Medellín, sua continuidade e a manutenção das novas estruturas são essenciais para resultados mais profundos. No Rio temos alguns exemplos de projetos que se descaracterizaram com o tempo, como o Favela Bairro. Como o programa é tratado hoje em dia?
 
A administração que sucedeu Sergio Fajardo em 2008 era do mesmo partido político e continuou com o programa. Assim, os PUIs (Projetos Urbanos Integrados) foram desenvolvidos por oito anos. O atual governo continuou com algumas ações do programa, mas não na mesma intensidade. Eles deixaram de ser prioridade. Até hoje, três das 13 áreas mais críticas de Medellín receberam essas intervenções que redefinem a infraestrutura e implementam programas habitacionais, educacionais e sociais. Mas essa transformação precisa ser levada adiante por muitos anos mais.
 
O senhor fez uma visita ao Complexo do Alemão, uma das áreas do Rio que precisa de investimentos variados. Quais foram as impressões sobre o lugar e o projeto do teleférico?
 
Queria saber que outros programas e projetos foram feitos lá além do teleférico, se fizeram projetos culturais e sociais. Não conheço o contexto em detalhes e também não pude caminhar tanto por lá, mas me preocupou ver que as estações do teleférico estão nas partes altas. Uma das chaves para mim é que elas estejam no coração da região e não em áreas periféricas. Elas devem concentrar atividades e funcionar como ímãs para outros programas. Achei as estações muito desconectadas das atividades do lugar.
Ouvi um relato de que o teleférico é mais usado por quem vive nas partes altas. Os demais moradores descem de outros jeitos. E é preciso que esse tipo de transporte seja bem integrado com outros sistemas de mobilidade. Talvez o programa ali ainda esteja no início e ainda dependa de uma continuidade.
 
A preocupação estética nas construções erguidas nessas áreas pobres de Medellín se relaciona com a busca por uma mudança social?
 
Sim. Sempre nos preocupamos em aumentar a autoestima e a confiança dos moradores. Acreditamos que a estética e o bom design ajudam muito no aspecto mental, não apenas no físico. Um dos pontos mais importantes do programa é promover inclusão. E o bom design é uma chave para isso também. No governo Fajardo fizemos cinco parques biblioteca. No governo seguinte, fizeram mais três. A cultura e a educação foram o foco por trás de toda a transformação física. Cerca de 150 escolas foram reformadas ou construídas do zero. E um aspecto central nisso foi o envolvimento das comunidades com o programa.
 
Como foi a escolha dos arquitetos para os projetos?
 
Houve uma combinação de concursos nacionais de arquitetura para os prédios mais simbólicos, caso dos parques biblioteca. Os prédios menores e espaços públicos foram projetados por um time técnico da Empresa de Desenvolvimento Urbano, da prefeitura. Foi a equipe de lá também que liderou esses projetos estratégicos e sociais.
 
No Rio temos um projeto chamado Unidade de Polícia Pacificadora, que instala bases policiais nas favelas em busca da retomada do território dominado pelo tráfico. Muito se fala na necessidade de melhorar os demais serviços nas comunidades para reduzir os problemas sociais e a violência, resultado que vocês alcançaram nas áreas de Medellín onde os PUIs foram implantados. Como o urbanismo social ajuda nesse sentido?
 
Acredito que ele seja uma das principais ferramentas, mas não se resolve o problema de violência só com a transformação física. Tem que haver uma combinação com políticas sociais e educacionais, num projeto integrado, cuja complexidade varia de acordo com as características de cada área. O sucesso depende dessa complexidade e da integração entre os projetos. A experiência no PUI Nordeste foi muito boa. A situação de violência melhorou muito. Na Comuna 13, foi um pouco mais complicado. Ainda temos problemas de segurança em Medellín, mas eles se tornaram muito diferentes.
 
O senhor disse numa entrevista sobre o programa que no bairro Moravia (um dos três beneficiados) a questão central foi a realocação de parte dos moradores, tornando o processo mais longo e delicado. O Rio tem vivido muitas remoções de comunidades. Quais cuidados devem ser tomados nessas experiências?
 
Moravia tinha problemas de contaminação do solo, porque lá já houve um lixão. A cidade tinha que realocar os moradores e fez isso numa nova área de expansão de Medellín, que passou a concentrar uma população pobre e problemas sociais. Esse tipo de processo foi ruim. Os melhores exemplos de realocação aconteceram quando as pessoas foram morar em locais próximos ao de origem, mantendo suas relações sociais e econômicas. As relações invisíveis também são importantes. Foi o caso do projeto de habitação Juan Bobo, feito no PUI Nordeste. Estamos tentando pressionar o governo para que os novos processos construam moradias em locais próximos ao de origem. Você pode resolver muitos dos problemas futuros gerados com o reassentamento mantendo as relações já existentes.

Por Fabíola Gerbase 

Fonte: oglobo.globo.com/rio/o-urbanismo-social-do-arquiteto-alejandro-echeverri-na-transformacao-de-medellin-10113541

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